sábado, julho 25, 2009

VERTIGEM E SIGNIFICAÇÃO

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No que respeita ao homem, cujo ser é sempre em perigo, só o abismo, a queda e a vertigem não são idiossincrasia. O conjunto das idiossincrasias atende por nomes como história, cultura, realidade... Mas o abismo, a queda e a vertigem não são idiossincrasia: são absolutamente. E, no entanto, dado tal absoluto constituir o perigo que espreita e engendra especialmente o ser do homem, Ele não é, como para o idealismo tradicional, um em si e para si, mas um em mim e para mim do homem. Não obstante tal intimidade, o homem tende a silenciar ou desconversar sobre o abismo e a queda. Seu objetivo, contudo, não é guardar segredo: é negá-los, graças à vertigem que o desespera. Sob tal pathos, o homem se entrega então, num poético desvio de olhos, à história e seus correlatos. Almeja com isto um resgate. É pois nesta vã esperança que consiste a ilusão, e não propriamente na história e seus correlatos. Estes, enquanto idiossincrasia, e enquanto poiésis, não pertencem ao campo do que se costuma chamar “não-ser”. São, antes, sintoma ou signo de um modo especial de despencar: modo decorrente do revirar de olhos, que, todavia, está ligado à ameaça de não ser.

11 comentários:

gdec - Geraldes de Carvalho disse...

Há já bastante tempo que não nos "víamos" caro Edilson . Vim hoje aqui e encontrei estas magníficas reflexões . Gostei muito
Um abraço
Geraldes de Carvalho

Miller A. Matine disse...

Graças a minha vertigem que nao me desespera, aceitarei partilhar esse segredo que se me ocorreu ao ler o que escreveste: escreves com sangue! Isto é tudo que te posso dizer agora.

Obrigado por teres conhecido Moçambique através dos caminhos do Lepidóptero.

Abrc!

Dora disse...

Oi, Edilson. O "papo" tá sério! rs
Seguindo seu raciocínio: o absoluto do ser é a "queda". E essa queda, representando o perigo, não é um "em si" e um "para si", mas, um "em mim" e um "para mim". Subjetividade completa. O homem, no entanto, nega ou silencia esses dados, por medo. E se lança na esperança das idiossincrasias, que não pertencem ao "não ser".
Mas, o homem se entrega às ilusões por temer justamente a queda. Então, vem o perigo de cair no "não ser".
Talvez eu discorde, bem na raiz da sua dedução.
Penso que o absoluto do Ser não pode ser determinado. O homem só É, na medida em que se constrói exatamente nas idiossincrasias.
Teoria existencialista? Mais ou menos.
Estou com receio de ter falado "um asneirol"...rs
Corrija-me!
Abraço grande!
Dora

diovvani mendonça disse...

Caro Edilson,
Há quanto tempo não trocamos idéias e palavras... Bom percorrer novamente as linhas do seu raciocínio, mesmo constatando que às vezes eu me perca nele, por pura incompetência minha. Mas, acredito que toda palavra lida, mesmo sem ser totalmente compreendida, engravida. É aguardar e ver o que virá à luz.

Abraço das montanhas.

Edilson Pantoja disse...

Oi, Dora! Sim, está muito bom o papo! E, olha: não falaste nenhum “asneirol”. Ao contrário, tenho o maior prazer em ler teus comentários! Vamos lá!
Bom, mencionarei apenas o que me parece em desacordo com o que penso, e que expus nos três fragmentos já publicados, ok? Dizes que, segundo meu raciocínio: o absoluto do ser é a “queda”, certo? E eu respondo que, em relação ao ser do homem, a queda (a Morte e o morrer) é algo absoluto. E por quê? Por tratar-se de algo que ele, homem, não pode mudar. E mais: é na relação com a queda que o ser do homem se constitui (daí o em mim e para mim. Ressalto, porém, que, com isto, não me refiro diretamente ao indivíduo, mas à Humanidade, ao ser-Homem. É claro, contudo, que a relação com o absoluto também provoca reações, as mais diversas possível, em nível individual). Por conta de tal relação, tal ser (do homem) se caracteriza como “sempre em perigo”. Veja que eu não me refiro ao Ser. Este, na minha compreensão, é apenas um dos inúmeros significados a que o homem chegou por conta da relação com a queda. No fragmento de n. 05, quando farei referência às doutrinas em geral, abordarei isto. Em outras palavras, o Ser, assim, com maiúsculo, é, como tudo o mais na cultura ou história ou civilização, etc, idiossincrasia. Com tal conceito (idiossincrasia ) expresso tudo o que não pertence ao absoluto, mas nasce da relação do homem com Ele (absoluto). Tem a ver com o modo como o homem, ao se recusar (em vão!) cair, molda a si mesmo e ao mundo, a realidade, a história, etc (uso todas essas palavras - realidade, cultura, história, mundo, etc., como sinônimas.) Veja que, conforme penso, o homem, devido à tendência a fugir da queda, produz a si e a seu mundo (cultura). Por isso utilizei o termo grego poiésis, que, como sabes, significa algo como produção. Nisto concordamos, pois disseste: “O homem só É, na medida em que se constrói exatamente nas idiossincrasias.”
Quanto às idiossincrasias não pertencerem ao “não ser”, isto significa que a história ou cultura, etc., não são uma nulidade. Elas de fato são algo, embora não sejam um absoluto. Eu quis frisar que elas não são mera ilusão, embora tenham como pano de fundo a ilusão (humana) do resgate, bem como a ameaça que paira sobre o homem: a ameaça (mortal) de deixar de ser. Isto é, o pano de fundo de onde as ilusões surgem é a fuga do homem ante a ameça de não ser: da morte que lhe espreita sempre ameaçadora. A morte é quem, enquanto “ameaça” de não ser, dará cabo ao ser do homem, afinal. Tudo isto me parece justificar o título do projeto, pois é justamente por experimentar a vertigem da queda e reagir conforme descrito, que o homem cria a cultura, isto é, todas as significações. Entre elas, também o conceito de Ser e a compreensão de que Ele é indeterminável, ok?
Deixa eu esclarecer mais um ponto. Disseste: "Mas, o homem se entrega às ilusões por temer justamente a queda. Então, vem o perigo de cair no "não ser"."
Bom, quanto ao primeiro período, nada a acrescentar. É isto mesmo! Quanto ao segundo, digo que o perigo de não ser espreita sempre o homem, e não apenas após ele se entregar às ilusões. Na verdade, como dito, é justamente por ser sempre em perigo que o homem se volta para cultura.
Bom, continuemos!
Abraço!

Edilson Pantoja disse...

Diovvani, poeta das Minas, caro, é um prazer enorme tornar a recebê-lo por aqui!
Forte abraço!

Eliana Guedes disse...

El vertigo... só por andar sobre duas patas, o ser humano já tem a vertigem como um sexto sentido. Belíssimo o teu blog. Abraço, Eliana

clarice ge disse...

Deu nó... Se a queda é a morte anunciada, a vertigem é o que nos (con)forma. Tudo pode acontecer neste trajeto. Por mais que elaboremos certezas, todas serão incertas. Durante o percurso temos a ilusão de ser criadores enquanto os fatos vão nos criando.
Tuas palavras estão mastigando meus pensamentos... me faltam palavras para expor minhas caraminholas. Salve Mestre Edilson, abraço meu.

clarice ge disse...

ah, a palavra que não deu pra entender é atoamente. atoamente guarda a esperança que o futuro corrija o presente...
bjs

marcos pardim disse...

reviramos, e precisamos mesmo revirar o olhos, meu caro edilson, porque despencados vivemos durante este breve hiato que, primeiro separa para depois unir, a estrela e a cruz nossa de todo dia. grande abraço.

Dora disse...

Edilson. Vim procurar post novo...Curiosidade também faz parte da vida! rs
Abraços.
Dora